Presbíteros

Na continuação do nosso percurso de transição para uma liderança plural e mista, prosseguimos na reflexão de termos utilizados no Novo Testamento para as responsabilidades de liderança na igreja. Lemos o texto de Atos 15:1-6; 22-23 e refletimos sobre o papel dos anciãos ou presbíteros.

Dependendo das traduções e versões da Bíblia, para a palavra original πρεσβύτερος (presbyteros), encontramos o termo “presbítero”, “ancião” ou “mais velho(a)/idoso(a)”. Quando uma palavra, numa determinada língua, tem uma variedade de significados, torna-se mais difícil a tarefa do tradutor em determinar que termo deve ser usado. Normalmente, o contexto do próprio texto tem um grande peso nessa tarefa. Por outras palavras, aquilo que foi escrito antes e depois dessa palavra e o próprio assunto geral ajuda a determinar que termo deverá ser usado na tradução, para fazer o máximo de justiça ao texto. Mas este não é o caso com a palavra “presbítero”. Este termo não é uma tradução, mas sim uma mera transliteração, na qual a palavra grega foi “aportuguesada”, com recurso aos nossos caracteres, mantendo, tanto quanto possível a sua fonética original. Esta opção não é determinada pelo contexto, nem por qualquer outro critério de interpretação textual. De facto, a escolha de não traduzir um termo, mas simplesmente transliterá-lo, não serve sequer o propósito de uma tradução: “interpretação do significado de um texto em uma língua (o texto fonte) e a produção de um novo texto em outra língua com sentido equivalente“(1).

A opção de simplesmente transliterar o termo grego, assume assim um carácter arbitrário, de acordo com a sensibilidade de cada tradutor bíblico (veja-se, por exemplo, a quantidade de escolhas diferentes, em relação ao mesmo texto onde este termo surge, nas dezenas de versões que existem, quer em português, quer em inglês). Desta forma, a escolha de manter a palavra sem ser traduzida, acaba por ser mais um indicador de algum pressuposto ou ideia preconcebida do tradutor do que uma inevitabilidade técnica, determinada pelo próprio texto. Manter um termo sem ser traduzido, como é o caso da palavra “presbítero”, parece querer conferir-lhe alguma natureza, estatuto ou importância acima e para além daquilo que o texto original permite. A menos que o termo original fosse intraduzível (o que não é o caso), esta opção redunda num artificialismo tendencioso que alimenta a concepção tradicionalista de que a liderança cristã constitui-se em “posições de autoridade”, num contexto mais ou menos hierárquico (declarado ou subentendido).

No fundo, em relação ao termo “presbítero”, até a opção de tradução entre “ancião” e “idoso/idosa” não é completamente determinada por elementos de contexto do próprio texto. Na realidade, em grande medida, o tradutor é quem vai determinar se o termo diz respeito a um dos líderes da igreja, eleito entre os anciãos, ou se se refere à generalidade das pessoas mais idosas.

Na sua primeira carta, Pedro dirige-se aos “presbíteros”, para lhes dizer que não deveriam agir como dominadores do rebanho, mas deveriam servir de exemplo – I Pedro 5:1-3. Ora, só é possível servir de exemplo entre iguais, entre pessoas que estão todas em pé de igualdade, entre as quais não existem estatutos, posições ou estratos diferentes. O líder é esse que serve de exemplo, porque está no mesmo nível, no mesmo patamar, em absoluto pé de igualdade com os que lidera. Toda e qualquer ideia que desequilibre esta dinâmica igualitária, consubstanciada pelo mandamento de sujeição mútua, é artificial e contrária ao ensino bíblico.

 

(1) https://pt.wikipedia.org/wiki/Tradução

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