Conforme antecipado, a nossa igreja tomou conhecimento de que o facto de ter reconhecido publicamente a liderança pastoral exercida por mulheres será submetido à análise da Assembleia Geral da Convenção Baptista Portuguesa, tendo sido avançado, como provável desfecho, a aplicação de uma sanção disciplinar à Igreja.
Temos plena consciência de que é através da cooperação entre Igrejas com quem partilhamos o essencial da Fé que alcançamos o que não conseguiríamos doutro modo alcançar. Por isso, afirmamos pertencer ao conjunto de Igrejas que formam a Convenção Baptista Portuguesa e desejamos continuar a pertencer.
Clarificamos que a decisão de reconhecer a liderança pastoral feminina não foi tomada de forma irrefletida, mas resultou de um longo processo de análise e estudo bíblico, em contexto congregacional, traduzido nas sucessivas decisões tomadas unanimemente pela Igreja, nomeadamente:
– Em 12 de janeiro de 2024, a Igreja da Praia da Vitória passou por um processo de transição, mediante o qual fomos impelidos a reestruturar o modelo de liderança até então adotado, no intuito de reconhecer e validar os líderes que Deus já nos havia dado e de promover uma liderança plural, participativa, dinâmica e interdependente, tornando-nos menos dependentes de ajudas externas e, eventualmente, se o Senhor assim nos dirigisse, admitindo a consagração de mulheres ao ministério pastoral;
– A 12 de maio do mesmo ano, tendo-nos sido colocado, ainda que de modo informal, o cenário de uma possível ação disciplinar, a Igreja voltou a debater o assunto, tendo reiterado a convicção de que era nesse sentido que Deus nos estava a conduzir e de que teríamos de decidir de acordo com essa consciência;
– No dia 28 de julho de 2024, a igreja aprovou a nova redação dos seus estatutos, na qual faz eco deste modelo de liderança, substituindo a figura de “O Pastor da Igreja” pela d’“A Equipa Pastoral”, constituída por várias pessoas idóneas, a quem sejam reconhecidos os dons adequados à função, homens e/ou mulheres;
– No dia 5 de janeiro de 2025, foi eleita e tomou posse a nova Equipa Pastoral da Igreja, composta por quatro pessoas, entre as quais duas mulheres.
Conforme referido, estas decisões tiveram por base um processo de análise aprofundada do ensinamento bíblico sobre o assunto da liderança na Igreja, do qual resultou o seguinte entendimento:
1. Deus coloca na igreja as pessoas e os dons que entende necessários para desenvolver o ministério para que foi chamada, na comunidade em que está inserida, em cada momento e circunstância;
2. Deus atribui dons de acordo com a sua soberania e perfeita sabedoria, não estando limitado pelo sexo das pessoas a quem dá esses dons, incluindo os dons necessários ao exercício da função pastoral;
3. A decisão de como se deve estruturar e compor a liderança da Igreja é um assunto do âmbito local, salvaguardada a sua autonomia, em respeito pelas Escrituras e em consonância com o que consideramos ser a muito boa tradição Baptista;
4. Compete à igreja local reconhecer os dons que Deus dá e promover as condições necessárias para o seu exercício, na liberdade do Espírito do Senhor;
5. Apesar da depreciação de que era alvo a mulher no tempo e cultura para que nos remete o Novo Testamento, o que ficou registado nos Evangelhos, no Livro dos Atos e nas Cartas dos Apóstolos, inegavelmente, evidencia uma importante mudança de paradigma, materializada na atenção dispensada à mulher, na sua dignificação, na sua participação e envolvimento na efervescente vida da Igreja primitiva, onde a sua liderança foi amplamente aceite e elogiada;
6. As limitações colocadas, também no Novo Testamento, não apenas à liderança, mas à participação da mulher nas atividades da igreja reunida, foram circunstanciais, isto é, a sua aplicação circunscreveu-se à situação, contexto e características muito particulares dos destinatários originais;
7. Os textos do Novo Testamento onde se encontram registadas as supracitadas limitações merecem, por isso, uma interpretação devidamente contextualizada e que resulta na aplicação de princípios, esses sim universais, de organização, boa convivência, sujeição e respeito mútuos e adequação cultural;
8. Compete à Igreja honrar e dar seguimento ao modelo do Novo Testamento, onde, fruto da redenção trazida pelo Evangelho, homens e mulheres servem lado a lado, sem distinção;
9. O reconhecimento de mulheres no ministério pastoral não nos torna mais modernos, progressistas ou atuais, mas, sim, mais próximos do padrão inaugurado por Jesus na Nova Aliança que estabeleceu com a Humanidade e mais próximos da vontade de Deus para a Sua Igreja;
10. A decisão da Assembleia Geral da Convenção, em 2014, de exigir que em todas as igrejas associadas o ministério pastoral seja desenvolvido exclusivamente por homens extravasou o âmbito e os poderes estatutários do organismo cooperativo e constituiu uma ingerência em assuntos do âmbito de cada Igreja local;
11. Mesmo tendo uma posição diferente sobre a consagração feminina ao ministério pastoral, É POSSÍVEL E DESEJÁVEL A COOPERAÇÃO com as Igrejas que assim o desejem, pelo que estamos dispostos a manter a nossa participação neste organismo cooperativo, mesmo sabendo que nem todos concordarão connosco.
Por conseguinte, o nosso apelo é que se promova uma reflexão sobre o cerne da questão, que não será tanto sobre a consagração feminina ao ministério pastoral, mas sobre se as diferenças de entendimento acerca da mesma constituem real impedimento à continuidade da cooperação.
Reiteramos o nosso desejo de seguirmos no caminho em que, enquanto Igreja, Deus nos tem dirigido e de continuar a cooperar com a CBP, em amizade e paz.