Ao aproximarmo-nos do final desta fase de estudo bíblico sobre a liderança da igreja, explorámos um pouco do texto de I Timóteo 3:1-7, no qual Paulo expõe as qualificações do líder cristão (bispo, do grego “episcopos”). Considerámos os seguintes pontos:
- A ideia de se desejar (ou almejar ou aspirar) o episcopado mostra que se deve considerar a vontade de servir nessas funções como um critério válido e a ter em conta. É frequente ouvirmos advertências contra se fazer “a nossa vontade”, ensino que, embora bem intencionado, pode não encerrar toda a verdade. E esta é que, quando nos entregamos a Deus, passamos a ter a “mente de Cristo“ e ele opera em nós “tanto o querer como o efetuar”. Se cremos que ele nos transforma integralmente, cremos que ele transforma os nossos desejos – a sua vontade é o nosso prazer, parafraseando o salmista – e aí faz sentido que estejamos sensíveis ao que deseja o nosso coração, pois, certamente, será resultado do trabalho do Espírito em nós. Contudo, infelizmente, o conceito de chamada para funções de liderança tem sido de tal forma espiritualizado, leia-se mistificado, que pode paralisar potenciais candidatos, pelo menos até terem uma experiência do género sarça ardente.
- A linguagem masculina deste texto (“bispo”, “marido de uma só mulher”) não significa a impossibilidade de a mulher aspirar a esse ministério. Seria um erro transpor para a atualidade, sem a devida interpretação, uma linguagem referente a uma época em que, tipicamente, a mulher ficava circunscrita ao lar desde muito cedo, não tinha oportunidade de aprender a ler, nem a escrever, e que, por isso, não se esperaria que exercesse cargos públicos ou quaisquer funções de liderança. Mesmo assim, apesar disso, encontramos, no Novo Testamento, abundantes registos de mulheres que se destacavam em diversas funções e ministérios, no contexto da igreja.
- Uma interpretação literalista deste texto redundaria, por exemplo, na conclusão de que o bispo teria que ser casado e pai de filhos, e que só poderia manter esse ministério enquanto essas condições se mantivessem, o que não é o propósito do texto. Pelo contrário, o princípio universal é que, caso o líder seja casado, que o seja num relacionamento heterossexual e monogâmico, e ao qual seja fiel.
- Outras características do líder incluem, por exemplo, o ser irrepreensível, não conflituoso, moderado, capaz de ensinar (dom do Espírito), hospitaleiro, sensato, maduro na fé, cordial, generoso, com bom testemunho entre os de fora da igreja, etc. Compreende-se este elevado padrão, por um lado porque é este mesmo padrão de perfeição que se espera de todo o crente e, por outro lado, pela necessidade de o líder ser um exemplo para todo o rebanho. Todos estes princípios de comportamento e atitude aplicam-se, de igual modo a qualquer mulher.
- O cuidar bem ou governar bem a sua própria casa também é um critério importante, na medida em que traça um modelo de comportamento e responsabilidade para cuidar bem da própria igreja. Neste ponto, é de particular importância notar que, do ponto de vista histórico e cultural, no primeiro século e na cultura judaica, desde os seus primórdios, o cuidado da casa e da família competia, quase em exclusivo à mulher (veja-se a descrição da mulher virtuosa de Provérbios 31:10-31). Este facto é um elemento importante na compreensão da forma como o cuidado do lar também inclui a mulher nas qualificações para o episcopado.
Este texto não exclui a mulher das funções de liderança, nomeadamente na qualidade de pastora. Em vez disso, lança princípios e exigências de qualificações, comportamento e atitudes que podem e devem ser satisfeitos, quer por homens, quer por mulheres. Para além da questão do género, fica a percepção do elevado padrão para quem aspira a este tipo de ministério.